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terça-feira, 3 de agosto de 2010

Casamento homossexual é aprovado na Argentina: E no Brasil, quando vamos arrancar este direito?

Por Fernanda Tellez e Camila Radwanski
“A norma sexual, como qualquer forma de ideologia, não é algo que exista por si mesmo, se materializa em toda uma série de instituições sociais que, desta forma, desempenham outras funções. O processo de inculcar a norma sexual se opera principalmente no seio das três principais instituições encarregadas da educação dos indivíduos: a família, a escola, a igreja. (...) Além disso, as instituições encarregadas da reprodução da norma sexual encontram destaque nas instituições repressivas como a psiquiatria ou o cárcere, que cuidam dos desviados”
Jean Nicolas (1774-1823)



Após meses de debate intenso, no último dia 15 de julho foi aprovado na Argentina o casamento entre pessoas do mesmo sexo. O projeto que foi aprovado por 33 votos a favor, 27 contra e 3 abstenções – e com aprovação de 70% da população – já havia sido pautado duas vezes, mas fora adiado por falta de quorum. A pequena margem, que até o final da sessão colocou em perigo a aprovação da lei, demonstrou divisões entre base e aliados do governo de Cristina Kirchner e os setores mais conservadores, mas principalmente expressou a pressão dos milhares que estavam do lado de fora se mobilizando para arrancar seus direitos. Ao contrário de acreditar que de 'voto em voto' conquistaremos nossas reivindicações, nós não devemos deixar nas mãos dos deputados e senadores, oficialistas ou opositores, a conquista dos direitos democráticos – tais como o direito ao aborto legal, seguro e gratuito; e a separação entre Igreja e Estado.

Não podemos nos abster do real debate. Em um país de maioria católica, como na Argentina, a Igreja, que sempre que está prestes a perder algo de sua nefasta e reacionária influência, não hesitou em fazer uma ampla campanha contra este direito igualitário básico. Fizeram isto quando se tratava da lei do divórcio, e agora em sua “guerra santa” contra os homossexuais, dizendo que a “família é composta por mãe e pai”, ignorando assim a própria realidade do país na qual 30% das famílias são compostas por mulheres que criam seus filhos sozinhas.

 Em meio ao que foi proposto como uma “festa” de comemoração pela luta dada pelos movimentos LGBTTs, o PTS junto ao Pão e Rosas foram os únicos setores que se levantaram para dizer que: Sim! É momento de comemorar!, mas como Andrea D’Atri diz “significa também um primeiro passo muito importante que pode nos permitir avançar em outros direitos e liberdades democráticas, como o direito ao aborto ou a separação da Igreja e do Estado”, portanto, seguir na luta pelos direitos democráticos, como o direito ao aborto, não criando ilusões nos deputados que ditam as regras no governo em aliança com a igreja para garantir que nossos direitos democráticos elementares sejam conquistados, fortalecendo nossa luta com a ampliação de debate na esquerda, convocando a população à discutir as opressões e a forma como as superamos de forma independente dos patrões, dos governos e da Igreja, chamando debates nos locais de trabalho, sindicatos, secretarias de mulheres, universidades, grêmios estudantis. Após essa importante conquista democrática, Andrea D’atri, falando para os milhares presentes na frente do Congresso, junto a companheiras e companheiros do PTS e do Pan y Rosas, gritam: “Agora vamos por mais! Vamos pelo direito ao direito ao aborto livre e gratuito e pela separação da Igreja e do Estado!”

A situação do casamento homossexual no Brasil

O reconhecimento de união entre pessoas do mesmo sexo ocorre no Brasil apenas em decisões judiciais isoladas. O primeiro projeto de lei foi apresentado por Marta Suplicy (PT-SP) em 1995, mas jamais foi colocado em votação pela Câmara. Hoje, a própria Marta Suplicy, em ano eleitoral no Brasil, se isenta do debate declarando à população que este não é o momento adequado para se pautar esta discussão, já que “qualquer tema polêmico significa ganhar votos de um lado e perder de outro”, demonstrando que nessa democracia dos ricos os direitos democráticos são apenas moeda de troca por votos.

O estado do Rio Grande do Sul hoje é o mais avançado do país em relação aos direitos de união civil entre homossexuais, sendo o primeiro estado a publicar uma norma administrativa (da Corregedoria Geral da Justiça do estado) determinando que os cartórios de Títulos e Documentos registrassem contratos de união civil entre pessoas do mesmo sexo. Em julho de 2008, a Corregedoria Geral da Justiça do Piauí também expediu uma norma similar. Há também decisão, datada de 2002, que obriga os cartórios de Títulos e Documentos do município de São Paulo a registrarem tais contratos. No entanto, estas normas não ferem a legislação nacional sobre casamento e união estável em vigência e decisões referentes à direito à herança, pensão, planos de saúde, adoção, entre outros, ainda cabem à decisão final dos juízes. Isto acontece porque tanto o casamento quanto a união estável prevêem constitucionalmente que a família é a união apenas entre “homem e mulher”, sujeita à proteção especial do Estado. Desta forma, fica a critério de juízes garantir ou não as uniões entre homossexuais podendo alegar existir uma legislação federal que a impede.

Como a lei prevê que uma família só é considerada como tal quando há união entre homem e mulher, a adoção de crianças por casais homossexuais somente é possível por parte de uma das pessoas desta relação (no caso de solteiros sejam eles hetero ou homossexuais, a adoção é possível, porém é sujeita à decisão judicial a adoção por parte de casais homossexuais) .

O direito ao casamento homossexual é uma bandeira democrática. É lutar para que pessoas que se relacionam com outras do mesmo sexo tenham os mesmos direitos civis que os heterossexuais. Mesmo que como revolucionários não reivindiquemos o casamento em si, por se tratar de uma instituição burguesa com direitos que apontam pra manutenção da propriedade privada e um dos pilares da opressão às mulheres, acreditamos que devemos lutar para que todos seres humanos possam ter o mesmo direito de se casar sem nenhuma diferenciação seja no nome jurídico que se adote, seja em “restrições” como o não direito à adoção por casais homoafetivos, e tendo todas as pessoas em nosso país o mesmo o direito, podem optar ou não por ele.

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